quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

A relação criança X brinquedo X adulto






Profª Nylse Cunha
Presidente da Associação Brasileira de Brinquedotecas 


A maneira como as crianças tratam os brinquedos está relacionada com a forma como os receberam.

A criança sente quando está recebendo um brinquedo por razões subjetivas do adulto, que, muitas vezes, compra o brinquedo que gostaria de ter tido, que lhe dá status, que vai comprar o afeto ou servir como recurso para livrar-se da criança por um bom espaço de tempo.

A forma de introduzir o brinquedo à criança é importante. Em certas situações, pode apenas ser colocado no ambiente que a criança vai explorar; outras vezes precisa ser apresentado a ela, e mostradas as possibilidades de exploração que oferece. De qualquer maneira, é indispensável que a criança seja atraída por ele.


Olhos para ver


O adulto transmite à criança uma certa forma de "ver" as coisas. Quando apresentamos várias coisas ao mesmo tempo, ou então, por tempo insuficiente ou excessivo, estamos desestimulando o estabelecimento de uma atitude de observação.

Se quisermos que a criança aprenda a observar, se quisermos que ela realmente veja o que olha, teremos que escolher o momento certo para apresentar-lhe o objeto, motivá-la e dar-lhe tempo suficiente para que sua percepção penetre o objeto; teremos também que respeitar o seu desinteresse. Insistir quando a criança já está cansada é propiciar o aparecimento de certas reações negativas.

Aprender a ver é o primeiro passo para o processo de descoberta.
É o adulto quem pode proporcionar oportunidades para a criança ver coisas interessantes, mas é indispensável que respeitemos o momento de descoberta da criança para que ela possa desenvolver sua capacidade de concentração.
Assim como a criatividade da pessoa que interage com a criança poderá torná-la criativa, a paciência e a serenidade do adulto influenciarão também o desenvolvimento da capacidade de observar e de concentrar a atenção.



"Brinca com a gente..."

Brincar junto reforça os laços afetivos. É uma maneira de manifestar nosso amor à criança.

Todas as crianças gostam de brincar com os pais, com a professora, com os avós ou irmãos mais velhos.

A participação do adulto no jogo da criança eleva o nível de interesse, pelo enriquecimento que proporciona; pode também contribuir para o esclarecimento de dúvidas referentes às regras do jogo.

A criança sente-se ao mesmo tempo prestigiada e desafiada quando o parceiro da brincadeira é um adulto. Este, por sua vez, pode levar a criança a fazer descobertas e a viver experiências que tornam o brinquedo mais estimulante e mais rico em aprendizado.

Através da observação do desempenho das crianças com seus brinquedos podemos avaliar o nível de seu desenvolvimento motor e cognitivo. Dentro da atmosfera lúdica, manifestam suas potencialidades e, ao observá-las, poderemos enriquecer sua aprendizagem, fornecendo, através dos brinquedos, elementos nutrientes para seu desenvolvimento.

Devemos aproveitar esses momentos utilizando palavras adequadas, escutar as próprias palavras para verificar se estamos falando claramente e procurar responder por observações, pergunta e ações. Não colocar informações novas em excesso para que a criança possa aprender o que ouve; adaptar as frases ao nível da compreensão da criança, mas sem infantilizá-las.

O adulto que interage pode despertar a atenção e a compreensão da criança, enriquecendo seu brincar. Mas é imprescindível que antes de mais nada se observe como ela está brincando para respeitá-la, respeitando sua iniciativa, suas preferências, seu ritmo de ação e suas regras de jogo.

Não se deve interromper a concentração de uma criança que brinca, seria um sacrilégio. O momento em que ela está completamente absorvida pelo brinquedo é um momento mágico e precioso, em que esta sendo exercitada uma capacidade da maior importância, da qual depende sua eficiência quando adulto, que é a capacidade de observar e manter a atenção concentrada.

A criança deve explorar livremente o brinquedo, mesmo que a exploração não seja a que esperávamos. É preciso cuidado para que a intervenção do adulto não interrompa a linha de pensamento da criança e não atrapalha a simbolização que estava fazendo.

Para preservar a ludicidade, o adulto deve limitar-se a sugerir, a estimular, a explicar, sem impor determinada forma de agir. Que a criança aprende a utilizar o jogo descobrindo e compreendendo, e não por simples imitação.

Por ser importante que as atividades envolvam operações do pensamento, que solicitem a imaginação,a criatividade, e que possibilitem a descoberta, é necessária participação eventual do adulto. A criança precisa de alguém que escute e que a motive a falar, pensar e a inventar. Precisa tanto de atividades grupais que a levem a sociabilizar-se quanto de atividades individualizadas que possibilitem o atendimento às suas necessidades pessoais.

E quando a atividade tiver que ser interrompida, deve dar-se um tempo para a transição e mudança de atividade. Não podemos violentar a criança invadindo bruscamente o seu mundo.


"Brinque....mas depois você tem que arrumar tudo."



Esta frase antipática certamente tem uma justificativa, porém existem formas bem mais eficazes de fazer com que a criança adquira hábitos de ordem.

A arrumação dos brinquedos, colocada nestes termos, assume caráter punitivo, que irá provocar má vontade na hora de guardá-los.

O hábito de guardar os brinquedos com cuidado pode ser desenvolvido através da participação da criança na arrumação feita pelo adulto. Quando os pais ou a professora têm o hábito de, constantemente e naturalmente, guardar as peças com carinho depois de utilizá-las, automaticamente a criança adquire e aprende que zelar pela ordem e conservação do brinquedo é normal, e pode haver satisfação em guardar como houve no brincar.


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