sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Uma concordância ideológica


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Será que os erros de concordância sempre ocorrem por desconhecimento das regras ou será que é possível errar intencionalmente?

Às vezes o erro é intencional e está articulado com o contexto, com a intenção de quem escreve. Um exemplo inequívoco disso é a letra "Inútil", do grupo "Ultraje a Rigor".

A gente não sabemos escolher presidente
A gente não sabemos tomar conta da gente
A gente não sabemos nem escovar os dentes
Tem gringo pensando que nós é indigente
Inútil, a gente somos inútil
Inútil, a gente somos inútil

Em muitos lugares do Brasil pratica-se essa concordância com muita naturalidade. De acordo com a língua oficial, no entanto, trata-se de uma construção equivocada. "A gente não somos inútil", "a gente é inútil". Contudo, para o clima da letra, para o contexto que foi criado, é até necessário errar a concordância intencionalmente para que a sátira fique mais evidente. A forma gramatical busca aqui se adequar à mensagem. Por se tratar de texto poético, a quebra da norma se justifica porque visa a um fim determinado. Há consciência da parte do letrista de que se trata de um erro, cometido apenas para enfatizar a inutilidade desse "a gente" (que afirma sua incapacidade para até mesmo concordar o verbo com o sujeito).

Na linguagem formal, não há dúvida de que a construção recomendada é "Somos inúteis", "A gente é inútil", possuindo esta última construção um matiz coloquial pelo uso de "a gente" no lugar de "nós".

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