quarta-feira, 27 de julho de 2016

Portfólio: o que é e a que serve?



Georfrávia Montoza Alvarenga
Doutora em Educação, Docente do Depto. de Educação da UEL, 
Coordenadora do Núcleo de Estudos e 
Pesquisas em Avaliação Educacional da UEL
geomontoza@aol.com




Nos últimos 10 anos tem proliferado livros, dissertações e teses sobre avaliação, abordando a questão por vários ângulos. Alguns desses trabalhos são provocativos e estimulantes. Alguns teorizam com segurança sobre formas de avaliar, que gerem menos tensão que as práticas atuais, mostrando que muitas das formas utilizadas estão ultrapassadas e se faz necessário uma ruptura com o malogro que estamos experimentando. Temos uma série de dúvidas para as quais os conhecimentos especializados não oferecem resposta. Este é um texto sobre meus primeiros movimentos na abordagem de avaliação através de Portfólio e não se presta a conclusões definitivas. Apenas faço uma tentativa de reunir alguns princípios e propor uma forma de avaliar que pode beneficiar o professor que pretende mudar um pouco seu cotidiano e o aluno que pretende desenvolver um pouco mais suas competências e habilidades. A idéia é mudar o paradigma do professor muito ocupado com “dar o conteúdo” e “preparar provas”, auxiliando-o a usar o seu saber e experiência para alterar a relação pedagógica, avançando para uma prática avaliativa mais viável e adequadas às  necessidades do profissional para o milênio que se inicia.
Uma concepção mais caracterizada, uma prática transformadora, contextualizada e negociada pode começar a ser construída tendo a avaliação dentro do processo didático e não fora dele. A avaliação formativa é a mais indicada para esse objetivo, pois, é talvez a única que auxilia o aluno a apropriar-se das aprendizagens curricularmente estabelecidas. Esta avaliação acontece na intimidade da sala de aula onde a relação professor-aluno é mais estreita, especialmente na auto-avaliação feita pelo aluno e pelo professor individual e/ou coletivamente (Cortesão, 1993). A prática dessa avaliação requer que as metodologias intensifiquem o inter-relacionamento entre aluno-aluno e professor-aluno e oportunize ao aluno compreensão sobre seus processos de aprender. Observar, registrar e agir frente aos sinais enviados pelo aluno durante o processo ensino-aprendizagem e usar esses sinais para intervenções é o que se espera desta prática avaliativa (Cortesão, 1993, Perrenoud, 1999).
Uma das formas que tem demonstrado efeitos positivos e que cumpre requisitos da avaliação formativa é o Portfólio.

À medida em que a intenção de moldar e dirigir vai sendo substituída pela idéia de olhar o ser humano como capaz de selecionar, assimilar, projetar, interpretar, entre outras habilidades, a avaliação precisa ter conotação construtiva. O Portfólio é um instrumento que permite ao instrutor observar no aluno, a capacidade de resolver problemas e o desenvolvimento de competências  específicas através dos projetos que propõe e participa, além de fornecer uma série de  outras informações sobre os conhecimentos e atitudes, objetos da proposta curricular.
Portfólio, uma coleção dos trabalhos realizados pelo aluno, que permite acompanhar o seu desenvolvimento. Permite ainda analisar, avaliar, executar e apresentar produções  resultantes das atividades desenvolvidas num determinado do período.
O aluno arquiva e apresenta as evidências das habilidades, atitudes e conhecimentos definidos durante um tempo, acompanhado pelo responsável pelo curso.
Assim, o Portfólio nada mais é, que um instrumento que compreende a compilação de todos os trabalhos realizados pelos estudantes durante um curso ou disciplina e  inclui registro de visitas, resumos de textos, projetos e relatórios de pesquisa, anotações de experiências, ensaios auto-reflexivos. Quaisquer tarefas que permitam aos alunos a discussão de como a experiência no curso ou disciplina mudou sua vida, seus hábitos de estudo, e/ou seus comportamentos
Um Portfólio tem como maior objetivo ajudar o estudante a desenvolver a habilidade de avaliar seu próprio trabalho.
É também um excelente instrumento que pode auxiliar na avaliação do impacto de programas educacionais.
Serve especialmente para:
• Demonstração, pelo estudante, de habilidades específicas, competências e valores.
• Reflexão e avaliação por parte do aluno sobre seu próprio aprendizado e o avalie.
• Explicação, pelo estudante, da natureza do trabalho e que tipo de desenvolvimento esta tarefa possibilitou, além do
• Fornecimento de retro-informação (“feedback”) para os estudantes, pelo professor ou comitê que se responsabiliza pela avaliação do Portfólio.
A proposta pode ter variações em sua apresentação, mas em geral contém: carta de apresentação, síntese e reflexão sobre leituras feitas e atividades desenvolvidas e apresentadas, documentação que evidencie o progresso, apresentado sob várias formas, desde projetos desenvolvidos em sala de aula como atividades conduzidas em escolas; amostras de ferramentas utilizadas para aprendizagens pretendidas; reflexão sobre o desenvolvimento do aprendizado e das formas utilizadas para tal.

O grande mérito do Portfólio é sua tendência a centrar a reflexão na prática já que esta é a referência para construção, reconstrução e socialização do conhecimento.
Ganha relevo a ideia de continuidade, formação, diálogo, construção-reconstrução que pode se caracterizar como uma forma alternativa de prover o estudante com um rol de atitudes encadeadas, que acumuladas demonstram se o objetivo final foi alcançado.
Um “menu” de possibilidades nas quais os alunos podem demonstrar ou evidenciar seus ganhos pode ser previsto e discutido no início do processo já que todas as atividades requerem muitas decisões e são sempre desafiadoras. Conduzindo à reflexões (Anson, 1994), eixo básico do processo e início do pensar criticamente a realidade, olhando-a com mais clareza, abrangência e profundidade, esta é uma forma rica de ampliar o conhecimento, analisar situações, observar contradições e superar problemas.
O uso do Portfólio pelo professor,  enquanto ação pedagógica  inserida no processo didático, supõe domínio do currículo, do processo de aprender e de ensinar e como analisar o conjunto daí oriundo. A sua implementação exige envolvimento e comprometimento pois, de nada serve implantar um dispositivo sofisticado em uma pedagogia rudimentar (Gather e Perrenoud, 1988, Perrenoud, 1997).
Expor o aluno a uma variedade de situações suficientemente complexas que envolvam estimulação de uma variedade de inteligências além de verificar como as soluções são processadas (Gardner, 1995) é trabalho do avaliador quando se propõe a usar o Portfólio. A avaliação é mais efetiva quando o foco é direcionado para o desempenho da tarefa e para questões metacognitivas. O que importa é que através da coleta de informações sobre os tipos de projetos nos quais o aluno se envolve se faça o acompanhamento e se perceba que produtos foram alcançados.
A organização desses registros, ou a coleção das atividades desenvolvidas, na forma de Portfólio é uma parte reveladora do dossiê do aluno.
Gardner, (1995, p.191), apoiado por Wolf e colaboradores (1991) afirma que “a  maior parte do trabalho humano produtivo ocorre quando os indivíduos estão empenhados em projetos significativos e relativamente complexos que acontecem ao longo do tempo, são atraentes e motivadores e conduzem ao desenvolvimento do entendimento e da habilidade.”
Isto parece pertinente pois trabalhar em um projeto envolve interação com outras pessoas, colegas que fazem esboços, discutem, decidem e realizam ações efetivas e professores que orientam, discutem caminhos, analisam e avaliam.  Contribuições diversas permitem alterar e refletir sobre aprendizagens ocorridas durante um certo tempo.
O aluno, ao registrar os seus trabalhos, está organizando um Processofólio  (Wolf et all, 1991) que posteriormente será triado para reunir, em um Portfólio, aqueles que melhor representem sua produção.

O Processofólio representa uma documentação importante para o aluno no qual registra todos os projetos, seus percalços, suas dificuldades, desde os planos iniciais e provisórios, pontos críticos e tentativas de superá-los, objetivos e competências que alcançou, o que gostou ou desgostou, intervenções dos professores, além de novas propostas após avaliações.
Este trabalho é desenvolvido sempre durante a execução das tarefas e exige alguma forma de reflexão que objetiva ampliar a visão sobre o que foi feito. É a proposta de reconceitualização.
Embora seja de difícil aplicação e manejo em contextos amplos e apresente alguns riscos quanto às responsabilidades do aluno, é um instrumento especialmente útil. Cuidados relativos à dimensão, critérios, estágios e integração entre as atividades (como começam e se desenvolvem ao longo do ano) devem merecer cuidadosa atenção. Os registros do aluno devem ser respeitados em suas peculiaridades pois representam a forma de transpirar sua produção.
De tempos em tempos (negociado com os alunos) faz-se necessário uma apresentação do Portfólio aos colegas e orientadores. Comentários são tecidos a respeito do desenvolvimento do processo. O início pode parecer muito difícil mas com a experiência, os alunos vão aprimorando e desenvolvendo novas formas de se comunicar.
Ao escolher, no final do período, os trabalhos que representam sua melhor produção e montar o “Portfólio”  o aluno cria uma espécie de testemunha da sua ação em cada etapa da aprendizagem; é a memória de diversos momentos que envolve um inter-relacionamento dinâmico do psicológico com o pedagógico. Anseios, dificuldades, conquistas, formas de pensar, de ser, agir são mostradas. A característica de continuidade permite que ambos, professores e alunos, percebam os progressos individuais e coletivos.
Em termos práticos, a montagem de um Portfólio pode ser decomposto em passos ou etapas uma após a outras ou combinadas entre si (Shores e Grace, 2001):

  1. Estabelecer uma política para Portfólio
    2. Coletar amostra do trabalho
    3. Fotografar
    4. Entrevistar
    5. Consultar os seus planos
    6. Realizar registros sistemáticos
    7. Preparar relatórios
    8. Realizar registros
    9. Conduzir reuniões para análise
    10. Usar Portfólios em situações de transição (Processofólios)

Embora não sejam obrigatórias como um todo, cada etapa quando usada necessita de operações inseridas na dinâmica e na duração da ação permitindo feedback, para que ambos, professor e aluno situem-se em relação ao objetivo. Isso permite um encaminhamento de ajuste do processo.
O que se propõe com o portfólio é estabelecer um vínculo forte entre diagnóstico, processo e remedição, colocando a avaliação em todas as situações de interação professor aluno, o que também permite, que o aluno regule seus processos de pensamento e aprendizagem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1) CORTESÃO, L. Avaliação formativa: que desafios? Portugal : Asa, 1993.
2) GARDNER, H. Inteligências múltiplas: a teoria na prática. Porto Alegre : Artes Médicas, 1995. 
3) GATHER T. M.;  PERRENOUD, P. Savoir évaluer pour miex enseigner. Quelle formation de maêtres. Genéve, Service de la recherche sociologique, Cahier n.º 26, 1988.
4) PERRENOUD, P. Construire des compétences dés l’école. Paris: ESF Editeur, 1997.
5) PERRENOUD, P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens. Entre duas lógicas. Porto Alegre : Artes Médicas Sul, 1999. 
6) SHORES, E.; GRACE, C. Manual de portfólio: um guia passo a passo para o professor. Porto Alegre : Artmed, 2001.
7) WOLF, D. et.al. To use their minds well: investigating new forms of student assessment. In: G.Grant (ed). Review of research in education. Washington, D.C., v.17, p.31-74, 1991.


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